sábado, 10 de janeiro de 2009

Internet e Literatura

por Teócrito Abritta

Neste número o Montbläat chega gloriosamente a sua edição 300, estando caminhando pelo seu quinto ano de existência. Este percurso, como sabemos, tem sido difícil, mas, apesar das dificuldades, esta publicação independente continua existindo graças aos esforços de seu redator, Fritz Utzeri, da sua “equipe” de redação, de seus leitores e de alguns patrocinadores, mais movidos por interesses culturais do que econômicos ou políticos, como a Editora Sextante, contando ainda com a solidariedade de outros sites como bafafá on line, Guia Urbano e Universo da Mulher.

Hoje com o crescimento vertiginoso da Internet existe uma preocupação muito grande com o seu controle, tornando-se não um instrumento de democratização da informação, mas um dos mais eficientes meios de domínio da opinião pública.

Esta discussão do controle da informação é antiga e logo depois da Segunda Guerra Mundial refletia-se na literatura e no cinema, com obras como o romance Fahrenheit 451, de Ray Bradbury, lançado em 1953 e adaptado magnificamente para o cinema em 1966, sob a direção de François Truffaut. Esta época também ficou marcada pelo romance 1984 escrito por George Orwell em 1949. Nestas obras a cultura era perseguida implacavelmente, realidades imaginárias tornavam-se verdades e tudo era controlado por meios eletrônicos. Em certo sentido a nossa televisão exerce um enorme controle sobre a opinião pública, favorecendo versões de interesse dos seus patrocinadores, sejam marcas comerciais ou forças políticas que controlam a sociedade de uma maneira não democrática.

Com o avanço da Internet as coisas podem piorar, já que assistimos entre as novas gerações um acentuado declínio dos hábitos de leitura de documentos impressos – sejam livros, revistas ou jornais – ficando fortemente dependentes das informações que chegam as suas mãos, muitas vezes de uma forma passiva, pela Internet. Com o desprestígio das obras escritas e com a ausência de reflexões mais profundas, o domínio dos patrocinadores tende a ser absoluto, ditando a moda, dizendo o que comer, favorecendo preconceitos, elegendo políticos e assim por diante, já que tudo terá maior credibilidade sob o manto de alguma grande empresa telefônica que promova espetáculos com superstars do que a palavra de um pensador independente e pouco conhecido que usa como arma apenas um apelo para a reflexão.

Isto pode ser visto com o abandono criminoso da nossa cultura, dos nossos museus, centros culturais, bibliotecas, universidades e uma total ausência de políticas sérias de educação e promoção social. Mesmo na época da ditadura militar existiam programas educacionais, como o Mobral, e políticas de melhoria de museus e centros culturais. Esta situação de terra arrasada na área cultural, uma das tristes marcas do governo Lula, pode ser sintetizada na Figura 1, onde livros são transformados em meras colunas decorativas para uma mesa.



Figura 1 – Livros são transformados em colunas decorativas para uma mesa.

Mas, estamos aqui mais para festejar a sobrevivência do Montbläat do que para nos aprofundarmos nesta discussão. Neste sentido vamos falar um pouco das preocupações que a literatura, o segmento cultural mais vulnerável a um possível controle de opinião, tem desta problemática.

Para isto, convido-os a ler, ou reler, o conto “Biblioteca de Babel” de Jorge Luis Borges, escrito em 1941 (publicado em Ficções, Companhia das Letras – 2007) e o ensaio “Uma Carta para Borges”, escrito em 1996 por Susan Sontag (publicado em Questão de Ênfase, Companhia das Letras – 2005).

Borges usa a imagem de uma biblioteca como uma metáfora do universo, da humanidade e de sua criação. Após dez anos da morte de Borges, Susan Sontag fez uma grande homenagem a sua genialidade com este ensaio, em forma de uma carta pessoal, onde deixa transparecer as suas preocupações com os livros, a cultura e a liberdade de expressão. Abaixo transcrevo algumas das palavras desta escritora que conseguem falar muito mais do que os meus comentários.

... Se os livros desaparecerem, a história desaparecerá, e os seres humanos também. Tenho certeza de que você tem razão. Livros não são apenas a suma arbitrária de nossos sonhos e de nossa memória... Eles nos dão também o modelo da autotranscendência...
... Lamento ter de dizer a você que os livros, hoje, são tidos como uma espécie ameaçada...
... Em breve, nos dizem, invocaremos em “telas-livro” quaisquer “textos” que quisermos e poderemos alterar seu aspecto, fazer perguntas a eles, “interagir”. Quando os livros se tornarem “textos” com o que “interagiremos” segundo o critério da utilidade, a palavra escrita terá se transformado simplesmente em mais um aspecto da nossa realidade televisual regida pela publicidade. Esse é o glorioso futuro que está sendo criado e prometido para nós, como algo mais “democrático”. É claro, isso significa nada menos que a morte da interioridade – e do livro.
... Mas, esteja certo, alguns de nós não abandonaremos a Grande Biblioteca. E você continuará a ser o nosso patrono e o nosso herói.


Há quatro anos Susan Sontag partiu de nosso mundo para juntar-se a Borges na “Grande Biblioteca Celeste”, deixando-nos estas belas palavras para refletirmos.

Espero que esta reflexão contribua para que nós da comunidade do Mont encontremos uma solução para continuarmos semana após semana, construindo volumes para esta infinita biblioteca.

Um comentário:

Rogério Macedo disse...

Pessoal, indiquei o Cafezinho para receber o selo Troféu do Amigo, estou indicando para as pessoas que me ajudaram e ainda ajudam nesse mundo virtual. Passa lá no Blogalisando e pega ok?